A matriarca Ana Casto está no centro, ladeada pelas filhas religiosas. No alto, os casais Moreno/Juracy Castro e Dinaur/Dulce Pedroso. No degraus inferiores, as filhas mais novas da matriarca e os primeiros netos
A proximidade da festa de Nossa Senhora da Conceição representava agitação e trabalho na casa de minha avó Ana Castro, mãe de minha mãe, Dulce. A família toda era - e ainda é muito, enormemente - católica praticante. Era tanto que três irmãs de minha mãe eram religiosas: duas da congregação Irmãs do Preciosíssimo Sangue de Jesus (acho que era esse o nome), ligada ao convento de São Raimundo Nonato, no bairro da Aldeia, e uma da congregação (não lembro o nome) do convento de Santa Clara (as três depois abandonaram a vida religiosa). Isso sem falar nas tias Conceição e Dinha (Raimunda), que, por motivação também religiosa, optaram por não casar e manter votos de castidade e obediência ao bispo prelado local - na época, dom Tiago Ryan. Mas voltemos ao history line inicial.
A presença da família nos eventos religiosos da programação da festa era coisa sagrada. As missas eram diárias, fora as novenas, igualmente diárias. E depois ainda havia, toda noite, o trabalho delas na barraca da festa. Antes, no entanto, de dia, havia o trabalho de produzir milhares de canudinhos e pastéis, dezenas de bolos e pudins, além de paneladas e mais paneladas de pato no tucupi, vatapá e caruru, entre outros quitutes da época.
Dois "núcleos de produção" da família Castro trabalhavam muito naqueles dias: a casa da tia Jura, esposa do tio Moreno (Alberto), o filho mais velho da vó Ana, e a casa da própria matriarca, ambas na Aldeia. Eu e meus irmãos estávamos vinculados a este segundo núcleo - na verdade, por longo tempo, nossa família morou na casa da vó Ana (na foto acima, alguns membros da família Castro).
Nós, moleques, ficávamos com a parte mais gostosa, pois eram dias de fartura. Ajudávamos em algumas atividades, claro, como pegar as galinhas, patos e perus para matar e levar as panelas, bandejas e alguidares à barraca da santa, na beira do rio Tapajós, em frente à Matriz. Mas, de dia, o que não faltava eram formas de bolo e de pudim para "raspar" com os dedos, ou frigideiras e travessas com resto de recheio de canudinho e pastel para "limpar". Olha, uma delícia aquilo tudo!
Estou em Belém há trinta anos e, nesta época, a relembrar aqueles tempos maravilhosos, especialmente as noites de arraial. Era época de circo na cidade. Eles ficavam sempre na Praça Rodrigues dos Santos, ali na ilharga do Mercado Modelo, próximos à Matriz. Com pouco ou nenhum dinheiro no bolso, o desafio maior era "furar" o circo, aproveitando o descuido dos seguranças. Era uma aventura só! Mas, aos domingos, sempre ganhávamos umas moedas para o ingresso na programação vesperal. Uma festa! Que coisa boa era aquilo, sô!
O lado ruim, devo confessar, era a programação religiosa. As missas eram muito longas, as novena, sofríveis. Ficar de joelho por longo tempo era coisa que eu não gostava. No meu tempo e coroinha (ou acólito), a coisa era diferente. Eu gostava, porque participava ajudando os padres e o bispo na Eucaristia, servindo o vinho e a água, tocando a sineta na hora da consagração e ajudando com a palheta na comunhão. Lembranças de outrora.
Nossa Senhora da Conceição, padroeira dos mocorongos. São lembranças vivas na minha memória, rituais presentes por longo tempo de minha vida. Hoje, laico, não comungo mais das mesmas crenças, mas tenho um respeito profundo por tudo isso, pois são elementos ainda presentes na vida de minhas famílias materna e paterna, são elementos da nossa cultura, das nossas tradições. Fazem parte da minha memória.
Boa festa a todos! Que o dia tenha sido de festa e de congraçamento entre as famílias mocorongas, entre todos.
Gostaria muito de estar aí, mas não foi possível.
Abraços a todos!
Atualização: 21h57
O jornalista e amigo J. Ninos informa o nome exato da congregação das irmãs que dirigem o convento de São Raimundo Nonato: Sociedade das Irmãs Adoradoras do Sangue de Cristo.
Obrigado, Jota!
3 comentários:
"Furar" o circo, essa lembrança é impagável, hehehe.
Esqueceste a foto da Família Castro.
Pergunto se no período da festa alguém da família tocava na banda de música que se apresentava no coreto? Lá, eu armava e desarmava a estante com as partituras do meu pai.
Seu Pedro
PP,
obrigado pela lembrança da foto, que já está publicada.
Lembraste de uma coisa das mais importates, realmente. Naquelas noites de arraial, a banda de música no coreto central era infalível e imperdível, pois atração das mais destacadas. Além de teu pai, o velho Dinaur Pedroso - naquela época, ainda novinho em folha - também era figura presente.
No caso do Dinaur, os ajudantes de ordem eram os dois mais velhos (Nal e Val), creio.
O Dinaur ainda pega o sax de vez em quando, e olha que ainda sai coisa muito boa, apesar da idade já avançada, 84 incompletos.
Valeu!
Muito legal essa lembrança. Fiquei aqui imaginando o quanto esses momentos deixam marcas em nossas vidas. São momentos simples, mas que ficam pra sempre na memória. Um abraço
Socorro Carvalho
www.minhasinspiracoes.blogspot.com
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