segunda-feira, 15 de novembro de 2010

"ENEM É INSTRUMENTO DE CLASSIFICAÇÃO DE ALUNOS RICOS ÀS UNIVERSIDADES PÚBLICAS"

O professor a amigo João Raimundo de Souza, diretor da Escola Cidade de Emaús, no bairro do Bengui, em Belém, comentado o post "E o que será agora do Enem?", publicado ontem, enviou o texto que segue abaixo:


Caro Piteira:

Com a ideia de fazer do ENEM uma prova para classificação de alunos às universidades públicas, o exame perde o sentido que possuía desde quando fora criado. Independente dos problemas de logística e erros que apresentem, o mais grave é verificar que agora os cursinhos voltam suas baterias para preparar alunos ao ENEM, que por sua vez passa a dificultar com graus mais elevados de conteúdos, deixando de apreciar habilidades antes necessárias de serem apreciadas, para que se considerasse a capacidade dos alunos de escolas públicas, que não recebiam e nem recebem a carga “conteudista” sonhada pela classe média. Uma carga de conteúdos cuja mais de 80% não servirá para nada ao longo da vida dos alunos.


É lamentável que esse exame tenha se tornado um mero instrumento de classificação dos alunos ricos às universidades públicas brasileiras. Na experiência passada, em 2006, nossa média na Escola Cidade de Emaús foi de 30%. Reivindicamos professores, brigamos com o governo e com os docentes que tínhamos e nossa média no ano seguinte passou para 40%. Hoje, duvido que nossos alunos consigam acompanhar o nível da prova. Se você comparar as questões dos exames anteriores com as atuais vai entender sobre o que estou falando. Disputamos agora é com Ideal, Universo, Teorema, etc.


Esse é o erro.


14 de novembro de 2010 21:32

COMENTÁRIO DO BLOG

João,

Precisas as considerações que fazes sobre o Enem! E elas me remetem, primeiro, a um fato e, depois, a uma avaliação feita por alguns especialistas, que bem conheces e com a qual imagino que concordes.

Vamos ao fato: encerra-se, neste ano, o exercício do atual Plano Nacional de Educação (PNE). Segundo a avaliação de professores, diretores e outros profissionais da educação, apenas 1/3 de suas metas estarão cumpridas pelo governo Lula.

Entre estas, merecem destaque:

* apenas13% dos estudantes brasileiros estão matriculados nas universidades, quando a meta era de 30%;

* 50% das crianças de 0 a 3 nos deveriam estar matriculadas em creches, mas, hoje, esse percentual não passa de 18%;

* analfabetismo insiste em se manter em torno de 10%, quando a meta era erradicá-lo até 2010 - e está claro que também esta meta não será atingida;

* apenas 6% do Produto Interno Bruto (PIB) são destinados à educação, quando o compromisso do Governo Lula era de alcançar 7%.

Dermeval Saviani, professor emérito da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e especialista em política educacional e história da educação brasileira, é categórico: o plano foi “solenemente ignorado” pelo atual governo.

Mas, surpreendentemente, às vésperas das eleições deste ano, o Ministério da Educação (MEC) anunciou que o ensino público brasileiro melhorou além da conta. Muito estranho!

Segundo o MEC, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) subiu de 4,2 pontos em 2007 para 4,6, em 2009. O resultado supera em 0,4 ponto a meta prevista para o ano passado (4,2).

O Ideb atribui uma nota para cada escola, assim como para as redes municipais e estaduais, que precisam cumprir metas bienais para melhorar a qualidade do ensino. É a partir dessas avaliações que é calculada a média nacional.

O ministério também atribui um Ideb para os anos finais do ensino fundamental e para o ensino médio. Nas séries finais do ensino fundamental, o indicador subiu de 3,8 em 2007 para 4,0 em 2009. A meta para o ano passado era 3,7.

Como aconteceu tamanho milagre, se apenas 1/3 do atual PNE foi cumprido pelo Governo Lula? Como aconteceu isso, se a realidade das escolas públicas mostra exatamente o oposto? Os debates ocorridos nas conferências municipais, estaduais e nacional de educação, no ano passado, e os relatórios por elas gerados desmentem o MEC.

Como a mentira tem perna curta, a Organização das Nações Unidas (ONU) acaba de divulgar os dados sobre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e ajuda a desmascarar os números maquiados do governo Lula sobre a educação do País.

Segundo a ONU, entre, 2009 e 2010, o Brasil melhorou sua posição no ranking do IDH, deixando o incômodo 77º lugar para ocupar a não menos incômoda 73º posição. Mas esse salto poderia ser ainda melhor se o Brasil apresentasse resultados mais dignos em itens que ainda nos envergonham, como a educação e a igualdade social.

Os números da educação demonstram o tamanho do desafio que o Brasil tem pela frente: o país perde, na maior parte dos indicadores, para outros em situação semelhante. Nossa taxa de evasão é elevada: 24,4%. Na prática, um em cada quatro alunos abandona os estudos antes da conclusão. O índice de repetência ultrapassa os 18%. O desempenho nesses quesitos é inferior ao do Congo, o mais miserável entre os miseráveis países africanos. A média de alunos por professor – 23 – é pior do que o do Tadjiquistão, micro ex-república satélite da extinta URSS. O nível de matrículas no nosso Ensino Superior também é baixo: 30%. Menos do que a Bolívia.

Para alcançar o IDH do Chile (0,783), por exemplo, o Brasil  ainda tem um longo caminho. O índice brasileiro (0,699) é inferior até mesmo à média da América Latina e do Caribe, que é de 0,704.

São inegáveis os avanços econômicos do Brasil na última década, alcançados pelo fato do país ter se mantido fiel aos pilares macroeconômicos definidos pelo Plano Real, a partir de 1994, e aprimorado-os nos anos seguintes, e favorecidos por uma conjuntura internacional que nos beneficiou.

Mas, por outro lado, os resultados desastrosos da educação pública, decorrentes da sua má gestão e da não prioridade ao seu caráter meritório, levam alguns especialistas a anteverem um cenário preocupante, se não ainda mais desastroso: o total comprometimento do futuro da atual geração de estudantes.

Definitivamente, o Governo Lula deu mais importância ao programa Bolsa Família que à execução das metas do PNE. As consequências de tamanha irresponsabilidade estão aí para nos envergonharem: o IDH do Brasil (0.699) não apenas nos coloca distante, muito distante, da Noruega (0.938) e da Austrália (0.937), os orgulhosamente melhor posicionados no ranking, mas nos iguala à desconhecida Geórgia (0.698), uma ex-república soviética, e à Venezuela, vitimizada pelas loucuras do bufão Hugo Cháves. E mais: nos coloca atrás do Irã (0.702), comandando pelo assassino Ahmadinejad, e da Armênia (0.695), outra republiqueta que se livrou do domínio soviético há pouco mais de 25 anos.

Pelo visto, João, o calamitoso Enem mais parece um ingrediente de um desastre maior, construído pela incompetência política e a irresponsabilidade de dirigentes mais preocupados em gerar números que favoreçam as políticas de partidos e governos, abandonando a educação como política de Estado.

Reluto, diante da crueza dos fatos - mais dramáticos que os discursos eleitoreiros e oportunistas - a acreditar que esse seja um cenário marcadamente diferente no final da presente década. Mas vou ficar feliz, muito feliz, se os fatos me contradizerem.

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