Na tarde da próxima quinta-feira, em um bar da Cidade Velha, aqui em Belém, um grupo de ex-seminaristas vai se reencontrar para matar a saudade, resgatar as lembranças memoráveis e engraçadas que viveram em Santarém e Belém, quando apostavam na vida sacerdotal, e saber das novidades de cada um.
Do grupo, apenas um seguiu em frente e, há anos, é diácono em uma paróquia de Belém. Os demais optaram pela vida profissional em outras áreas, como o Direito, a Educação, a Magistratura, o Jornalismo, o empreendedorismo, entre outras. Não por acaso, o grupo de autodenomina "Enganadores do Bispo" - no caso, dom Tiago Ryan, falecido bispo da diocese de Santarém, que tanto investiu nos seus pupilos, mas poucos, pouquíssimos, chegaram a rezar uma missa. Eu vou estar no meio da turma.
Somos, quase todos, da cidade de Santarém, no Baixo Amazonas. Mocorongos, portanto, todos de origem humilde e motivados pelo pensamento inovador do Concílio Vaticano II e pela opção política apontada pela Conferência Episcopal de Puebla, no México, em 1978 - aquela que indicou a opção preferencial pelos pobres.
Já em Belém - no meu caso, a partir de janeiro de 1980 -, e em meio aos debates e confrontos políticos próprios de uma ditadura que agonizava e, com a derrota eleitoral de 1978, apontava à distenção política e à redemocratização do País, todos fomos contaminados pela efervescência política daqueles anos difíceis.
A maioria se envolveu com partidos políticos que até então viviam na clandestinidade. Depois, com a criação do Partido dos Trabalhadores (PT), com o massivo e envolvente movimento comunitário, com a luta pelo direito de morar, a luta pelos direitos humanos, pelas reformas urbana e rural, pela anistia ampla, geral e irrestrita; pela liberdade aos padres e agricultores presos no Araguaia. A Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH) era uma espécie de entidade-mãe, que juntava os militantes mais destacados e atuantes. Eu não escapei de tudo isso.
Anos depois, uns ainda persistem em acreditar no PT, outros se decepcionaram e buscaram outros meios de ação política. E apenas um, unzinho só, atendeu aos clamores quase paternos do dom Tiago Ryan.
No encontro de quinta, tudo isso certamente virá à tona, assim como a história de um dentre nós que, depois de umas cachaças a mais, acabou dentro de uma casa, no início de uma madrugada, no bairro do Jurunas, em meio ao susto da dona da casa. A coincidência das maiores coincidências: a chave que abria a porta de nossa casa, no bairro de Batista Campos, também abriu o cadeado daquela casa do Jurunas. Resultado: frei Pedro Amém, nosso superior, acabou indo à delegacia do bairro para soltar o infortunado companheiro.
Vamos rir muito com essa e outras tantas histórias, algumas impublicáveis, claro.
2 comentários:
Parabéns. Em época de ditadura militar o caminho certo era a luta pela redemocratização do país. Esses rapazes fizeram o que tinha que ser feito. Perguntem se eles estão arrependidos.
Quem se acomodou e nada fez no final dos anos 70 e durante toda a década de 80 não tem nada pra contar pros ses filhos.
Esses caras viveram o seu tempo.
Piteira, Mon ami fraternel,
tivemos muitos sonhos e ideais compartilhados. Bem vividos! Eles não se perderam no tempo, nem foram tentativas vãs, antes eram e são ainda hoje convergentes ainda hoje por um nexo comum: o ideário ético em nossas opções de vida.
A história de cada um de nós foi sendo construída assim (coletivamente) e também conforme seus desafios próprios.
Penso que hoje, no imaginário ou ideário de cada um (que já transcende aos nossos filhos), os resultados são positivos.
Por isso, mi frater fraterna, acho que Dom Tiago Ryan - com a luz agora transcendentalmente espiritualizada - sorri (na infinitude de sua alma) porque seus meninos de ontem são homens responsáveis de hoje.
« Non, nous ne sommes pas trompeuse dans bishop», antes éramos jovens seminaristas à procura de suas identidades. E o dom Tiago, que também era uma espécie de pai, disso sabia... e, assim, nessa condição mista alimentou nossos ideários.
Recevez mes étreinte fraternelle, mon cher ami.
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