Um encontro vai reunir, amanhã, na Cidade Velha, aqui em Belém, uma turma de velhos amigos, um grupo de pessoas que dedicou parte de suas vidas, nos anos 70 até meados da década e 80, em ações de luta contra a Ditadura Militar e pela redemocratização do Brasil.
Lá deverão estar, primeiro, a Vera Tavares, que é a anfitriã. Euniciana Peloso e Valdemar, que tomaram a frente, junto com a Verinha, da organização e mobilização da turma. Também estarão Paulo Santos, Carlos Boução, Miguel Chicaoka, Cléa, Léo e a dona Luzia - estas, mãe e filha, militantes das mais guerreiras do movimento comunitário, no Jurunas.
Também o Luís Braga foi convidado, ele outro dos mais dedicados e combativos líderes comunitários do Jurunas. Estendi o convite ao João Raimundo, professor e, hoje, acadêmico de Direito. Soube que Valmir Bispo, Daniel Veiga, Edilza Fontes, Raul Meireles e João Vital também foram contactados. Gerson Lúcio Dumont, idem. A maioria deles continua, hoje, militante ou simpatizante do Partido dos Trabalhadores. Outros, depois de anos de militância no partido, se afastaram. Sou um destes. Hoje, são como jurássicos sobreviventes de um "período de chumbo".
Todos, uns mais outros menos, estiveram envolvidos em movimentos políticos da época, centrados na luta pela restauração da Democracia no Brasil, na luta pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita, pelas reformas Urbana e Agrária, pela liberdade de pensamento e expressão, pela liberdade de impresa, pela meia passagem nos ônibus e e meia entrada nos eventos culturais para os estudantes.
Num período de exceção política, quando as liberdades individuais e coletivas eram restritas, vigiadas e reprimidas pelas forças dos generais, quando o bipartidarismo nos dividia entre prós e contras o regime, a estratégia era nos juntarmos em entidades que assumiram a luta contra a Ditadura Militar. A Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SPDDH) era a principal entidade democrática do período. A totalidade, senão a maioria, dos presentes, amanhã, no encontro na casa da Verinha passou pela SPDDH e pelo jornal Resistência - "Resistir é o Primeiro Passo" era o slogan dele, proposto, creio eu, pelo jornalista João Marques, que foi vereador em Belém pelo MDB, entre outros fronts por ele assumidos na luta contra o regime dos generais.
No encontro e amanhã, certamente que as lembranças desses movimentos serão resgatadas, não com saudosismo melancólico, mas como exercício de diálogo sobre um período político que nos forjou para a luta democrática e marcou nossas vidas para sempre. Lembrar dos mutirões de redação e venda do Resistência, das invasões da Polícia Federal à Gráfica Suyá (onde este era impresso) e da sede da CNBB, na Cidade Velha, onde se reunia o Movimento pela Libertação dos Presos do Araguaia (MLPA); das megamanifestações, na Praça Dom Pedro II, pelo direito de morar, pela meia passagem; das operações "pula roleta" organizadas pela UNE,UAP, Umes e outras organizações de estudantes... Assunto certamente que não vai faltar para alimentar a conversa dessa turma.
Chegado a Belém no início de 1980, vindo de Santarém, eu era "cristão novo" no meio de uma galera que já estava calejada naquela luta. Como bom noviço, aprendi muito com eles, li muito com eles, ajudei a construir sonhos e a lutar por eles. Se hoje valorizo muito a Democracia, se respeito princípios e valores universais, como a ética, a liberdade, a tolerância; se acredito na política e na democracia como meios indispensáveis para a construção de uma sociedade justa, fraterna e solidária, devo parte disso ao conhecimento, aprendizagem e amadurecimento construídos naquele período.
Este espaço seria pequeno para contar essas histórias todas, e certamente que vocês não teriam tempo para lê-las. Mas são histórias importantes não apenas para nós, que delas fomos protagonistas, mas também para a geração presente, pois fazem arte da história da redemocratização do Brasil, relatos que ainda precisarão ser reescritos, resgatados e contados às gerações presentes.
Depois conto como foi o encontro, e mostro algumas fotos.
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