sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Analisando o incomum, anormal e complicado processo eleitoral em Santarém, o também jornalista - e meu cunhado - Jota Ninos publicou no site www.notapajos.com o seguinte texto.

A lenta agonia de um coma eleitoral

A lenta agonia de um coma eleitoral

Santarém - Santarém está doente. Praticamente em coma, numa UTI jurídico-eleitoral desde 16 de dezembro de 2008, quando o registro da candidata reeleita Maria do Carmo (PT) foi cassado pelo TSE. De lá para cá, vem recebendo em seu leito vários dos chamados "remédios constitucionais" (liminares, cautelares, embargos e mandados de segurança) que mantém uma sobrevida a tão combalida paciente. Aliás, quem usufrui dos remédios é exatamente quem a deixou doente: os políticos.

Infectada pelo vírus da ganância pelo poder, transmitido por Martins, Maias, Rochas e assemelhados, a cidade entrou no mapa do Brasil não mais pela beleza de seu "Caribe da Amazônia", mas pela epidemia causada por seus políticos. Cada decisão que vem dos tribunais só prolonga a vida de um povo moribundo, praticamente à espera da extrema-unção. Como diria Chico Buarque, "a minha gente, hoje anda falando de lado e olhando pro chão..." O povo já não confia nem nos políticos, nem na Justiça. Votar e não votar, dá no mesmo, na opinião de muita gente.

A decisão de quinta-feira do TRE, baseada em outra decisão do TSE da semana passada, prolonga o coma até 5 de abril, quando poderemos ter uma nova eleição. Mas antes disso, é possível que a decisão de outro ministro do TSE, dê causa para mais um "remédio constitucional", que prolongará o coma ad eternum. Me explico: caso o recurso impetrado pelo PT contra a decisão que cassou o registro de Maria seja admitido como matéria constitucional, o processo será remetido ao STF que só julgará o recurso sabe lá quando. Aí é a hora de aplicar um novo "remédio", uma ação cautelar, para que Maria volte ao trono e aguarde a decisão que pode vir ou não antes do fim do mandato...

Haverá uma festa vermelha na cidade, e Maria fará discursos sobre sua condição de Joana D'arc, quase queimada pelo fogo dos injustos. Do outro lado, haverá resmungos alexandrinos, aguiaristas e maísticos e explosões marciopintenses. Peemedebistas chorarão por voltar à condição de co-adjuvantes (nada que um naco de secretarias não resolva). Mas Santarém não deixará sua condição de doente. Isso pouco importa para Martins, Maias, Rochas e assemelhados. Enquanto puderem sugar o sangue de Santarém, é melhor que ela continua em coma.

A verdade é que a doença de Santarém surge da falta de novas lideranças que alavanquem um novo debate sobre o que a cidade quer para daqui a 20 ou 30 anos. Chega de Mutirões desvairados e Cidades da Gente ensandecidas! Assim como na economia, temos vivido de ciclos comandados por oligarquias familiares, ou não. Nada diferente do Pará de Barbalho, do Maranhão de Sarney ou qualquer estado brasileiro.

A coisa vem desde a colonização da cidade até o período da ditadura. Na redemocratização, vivemos a fase Ron-Ron (Ronaldo Campos e Ronan Liberal) por 10 anos. Agora ainda estamos há 12 anos (podendo ter mais 4 anos) na fase Ma-Ma (Lira Maia e Maria do Carmo Martins. A última eleição não fecharia o ciclo, mas podia ter determinado o surgimento de outros nomes que provavelmente realimentariam as duas vertentes. Mas o imbróglio jurídico-eleitoral criou uma nova realidade.

De novidade nestas eleições só Márcio Pinto (PSOL), que teve uma participação inexpressiva na eleição de 2008, mas pode até sonhar com uma possível eleição em 2009. A candidatura de Márcio é uma parca esperança do novo PSOL, de conquistar uma prefeitura no Brasil pós-eleições. Todas as pesquisas a que tive acesso até agora, mostram Márcio à frente dos outros candidatos. O partido disputou em 2008 prefeituras em 274 municípios brasileiros, sem sucesso. E dos 2.367 candidatos a vereador, conseguiu eleger apenas 25, inclusive um no Pará (Garrafão do Norte). Daí o investimento com marqueteiros que vem do Rio Grande do Sul, aluguel de um comitê decente no centro da cidade e o desembarque de toda a trupe psolista da histriônica Heloísa Helena, previsto para o período da campanha de uma eleição que pode não acontecer.

Mas se Márcio não vingar, no mínimo ajudará a desenterrar o quase-morto Alexandre Von (PSDB), este reforçado pela candidatura a vice de Nélio Aguiar (PMN) que jura ter o controle sobre os tão propalados votos da "colônia nordestina". Isso porque, Márcio rouba mais votos do balaio petista do que do paneiro maista. Vale ressaltar que os filiados do PSOL em Santarém (que devem caber numa Kombi), ficaram tão ouriçados com a eleição suplementar que abriram até a vice-prefeitura para o PPS. Por pouco teríamos uma chapa de dois servidores da Justiça: Márcio Pinto (que além de professor é auxiliar de secretaria no Fórum) e Nerivaldo César (oficial de justiça, que foi candidato a vereador e protagonizou o episódio do mandado de segurança para não pedir votos para Maria). A coligação só não vingou porque o PPS, de Arnaldo Jordy (Belém), determinou que o partido deveria apoiar Lira Maia...

Helenilson Pontes e Nélio Aguiar, irmãos siameses que pareciam ser a esperança de uma terceira via, afundaram no pragmatismo do "farinha pouca, meu pirão primeiro". Perderam a chance de construir, dentro do PPS que comandavam, uma alternativa para o quadro eleitoral santareno. Helenilson, picado pela mosca-azul da suplência de deputado federal, caiu no canto da sereia barbalhista e se arrependeu amargamente. Foi adoçado até com uma secretaria de meio ambiente no governo interino de José Maria Tapajós em troca dos depoimentos pró-Maria, mas quando viu a possibilidade de substituí-la não duvidou em tentar implodir a coligação. Fracassado, acabou se entregando ao modelo "Lira Maia de governar" que tanto criticou, e enterrou de vez a pouca credibilidade que conquistara. E levou junto seu sorridente e teleguiado Nélio Aguiar, para o nimbo dos sem-postura...

Lira Maia, na condição de vampiro-mor, fez uma saída estratégica (ou forçada?) do front eleitoral. Seus asseclas tentam passar a imagem do "brilhante estrategista" que, de uma tacada, rouba duas figuras (Helenilson Pontes e Nélio Aguiar) e dois partidos (PPS e PMN) da aliança petista, para reforçar seu eterno pupilo Alexandre Von. Este por sua vez, se engana que agora virou um "líder partidário" e faz-de-conta que não depende do cabo eleitoral do Mutirão. Alexandre nunca honrou o nome do grande estrategista macedônio.

Antonio Rocha é outro que pode perder muito após o fim do imbróglio. Se sua imagem (e de seus filhos) não era boa, a pretensão de ser candidato a qualquer custo, pode custar-lhe um dissabor maior que aquele ato tresloucado no dia 1º de janeiro, quando o deputado perdeu a cabeça contra as provocações de um jovem psolista armado de um violão. O lado "coronel de barranco" falou mais alto e o eterno imperado do Lago Grande pode ter ameaçado mais sua imagem, com ou sem vitória de seu José Antonio. Aliás, faça-se justiça, o José Antonio não merecia isso. O medo de ter seu nome vinculado ao pai levou seus marqueteiros a utilizarem na campanha para 2009 o popular "Zé Antonio", sem o Rocha no final... E com um vice da estatura de um eterno fracassado Milton Peloso, só resta ao Zé Antonio amargar um terceiro lugar, caso as eleições aconteçam. Nesse momento, Os Rocha torcem para que Maria volte, pois fica tudo como dantes no quartel de Abrantes.

A decisão do TRE, prorrogando o coma eleitoral santareno, cai na medida para os petistas e peemedebistas. Uma sobrevida para que o verdadeiro imperador petista volte a reinar. Everaldo Martins Filho depende mais disso do que Maria. Já disse outras vezes, Maria precisa da estratégia de Everaldo, mas ele precisa do carisma de Maria para continuar nos bastidores da política. Se ela pudesse ser mais independente, a coisa seria diferente.

O projeto de poder de Everaldo (dando uma de "José Dirceu ao tucupi") já previa problemas para a reeleição de Maria, que insistiu em ser promotora pública licenciada ao invés de se desligar do MP (não podia abrir mão do salário, duas vezes maior que o da prefeitura). É quase certo que os everaldistas, como Inácio Corrêa e companhia, aguardassem um desfecho melhor no TSE, para que a questão fosse empurrada ao STF, dando tempo de, em 2010, Maria se liberar de vez do MP para concorrer a qualquer cargo (de deputada federal à senadora, ou até mesmo governadora, se Ana Júlia continuasse mal das pernas). José Antonio Rocha (ou "Zé Antonio", sem Rocha) assumiria a prefeitura e em 2012 Carlos Martins estaria pronto para tentar voltar ao trono martiniano. Quem sabe até com as bênçãos dos Pelosos e outros petistas ausentes.

Isso ainda pode acontecer, mas falta combinar com os Rocha e com os Barbalho. 2010 já está na ante-sala do nosso hospital. Barbalho carrega flores e espreita, pela fresta da porta, a pobre Santarém e seu coma eleitoral.

E para que não digam que sou pessimista, volto à mesma canção de Chico Buarque citada lá em cima: "apesar de você, amanhã pode ser outro dia..."

Jota Ninos

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